Por Rachel Duarte

 

Conferência LGBT pede criminalização da homofobia, casamento civil homossexual e mudança de nome para travestis e transgêneros | Foto: Marcello Casal Jr./ABr

 

Acabar com a discriminação e promover a cidadania de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais ainda é um desafio para o Brasil. Nesta quinta-feira (15) foi aberta em Brasília 2ª Conferência Nacional de Políticas Públicas e Direitos Humanos de LGBT, que segue até domingo, para debater avanços e desafios para o país. Os ativistas defendem prioritariamente a aprovação da criminalização da homofobia, do casamento civil homossexual e da mudança de nome para travestis e transgêneros.  Na abertura do evento, um coro de críticas e protestos cobrou do governo federal maior efetividade no enfrentamento do tema. A principal reivindicação é a relação do governo Dilma com a bancada evangélica que está influenciando na distribuição dos kits anti-homofobia nas escolas e na flexibilização do PL122, que criminaliza a homofobia no Brasil.

Na abertura do evento, militantes vaiaram e fizeram coro direto à presidenta Dilma Rousseff, que foi representada pelos ministros Gilberto Carvalho, da Secretaria da Presidência da República, Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos e Luiza Bairros, da Igualdade Racial.

Logo após a apresentação das autoridades, os ativistas LGBT entoram frases e cartazes dizendo, entre outras coisas, “Dilma, que papelão, não se governa com religião” e “Até quando vamos morrer para você não se constranger”. Em diversos momentos, os participantes chamaram pelo nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que na primeira edição da Conferência (2010) esteve na abertura do evento.

Marcello Casal Jr./ABr

Diante da situação, a ministra Maria do Rosário fez uma defesa curta da presidente durante seu discurso. “Não seria justo que a Secretaria de Direitos Humanos recebesse a compreensão de vocês e vocês não compreendessem que a Secretaria dos Direitos Humanos está aqui sob orientação da presidenta Dilma para lutar pelo reconhecimento dos direitos humanos”, disse.

Além de avaliar e propor as diretrizes para a implementação de políticas públicas voltadas ao combate à discriminação e promoção dos direitos humanos e cidadania de LGBT no país, a 2ª Conferência LGBT deve avaliar a implementação e execução do Plano Nacional de Promoção LGBT e propor estratégias para o seu fortalecimento.

Para o advogado paulista e integrante do Instituto Edson Néris e do Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual, Eduardo Piza de Mello, a realização de conferências é uma conquista importante para a sociedade brasileira. “Em outros governos não eram convocadas. Partimos do princípio de que são momentos ricos, com essência na finalidade de ouvir honestamente as bases e as suas reivindicações”, avalia.

Por outro lado, o advogado relaciona a realização do evento com a conjuntura real de escassez de direitos e aumento da violência contra homossexuais e salienta o descaso por parte do legislativo e executivo brasileiro. “Com esta omissão e um Congresso conservador, o que está nos salvando é o judiciário. Este é o terceiro governo que tem maioria parlamentar e não abraça a causa. Opta em ficar dando dinheiro para os projetos pontuais”, critica.

O ponto mais grave acusado por Mello e que está refletindo nos protestos da 2ª Conferência LGBT é a flexibilização no PLC 122, que criminaliza a homofobia no Brasil. Para passar pela bancada evangélica no Congresso, o texto recebeu ajustes acordados entre os senadores Marcelo Crivella (PRB), Demóstenes Torres (DEM) e Marta Suplicy (PT). Porém, as mudanças são consideradas por parte do movimento gay como soluções para “abrandar a agenda” do movimento LGBT, em nome da convivência com a base parlamentar.

Marcello Casal Jr./ABr

O advogado paulista lidera um movimento contrário a aprovação do PLC 122 nos termos atuais. O grupo é contra inclusive a presidência da Associação Brasileira de Gays, Bissexuais, Lésbicas, Travestis e Transexuais (ABGLT), responsável pela interlocução dos interesses da classe com os poderes federais. “Não há uma legitimidade na entidade. Parte dela é contra as alterações e o presidente ignorou isto. Depois do fiasco da Marta em retirar o substitutivo e permitir a redução no ponto que criminaliza a homofobia, fizemos uma plenária de 40 entidades contrárias a aprovação do PL”, explica.

Segundo Mello, a lógica do ‘melhor ter um PL do que nada’ não é hegemônica. “A nossa leitura é de que é melhor não aprovar o projeto e deixar esta ferida social aberta. A senadora Marta Suplicy conversa com o presidente da ABGLT, Toni Reis e não ouve a Frente Parlamentar e o deputado Jean Wyllys. A conversa é com os evangélicos e nos coloca como trouxas. Isto é um golpe para tentar conseguir louros nesta Conferência”, avalia sobre a recente tentativa da senadora petista em aprovar o PL 122 na Comissão de Direitos Humanos.

Caso de estupro em quartel é pauta do RS

Representando a delegação gaúcha no encontro, o coordenador do grupo Nuances, de Porto Alegre, Célio Golin, disse que os movimentos deveriam aproveitar a Conferência para pensar além das propostas e diretrizes que sairão do encontro, e refletir sobre seu papel  e organização na sociedade. “É um nível de discussão que o movimento gay não está preparado. Mais do que o termo ‘homoafetividade’ utilizado pelo STF para aprovar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, temos que buscar vencer na conquista da igualdade de direitos como um todo. É preciso mais do que isso. Conquistas pontuais ou com ajustes aos interesses dos religiosos são uma higienização das bichas para vendê-las à sociedade heterosexual”, considera.

Marcello Casal Jr./ABr

Além de participar da 2ª Conferência LGBT pelos direitos dos homossexuais, Célio Golin está levando uma pauta particular do Rio Grande do Sul considerada por ele como uma grave violação aos direitos humanos. O caso do soldado que alega ter sido estuprado em um quartel de Santa Maria, interior do estado, ainda aguarda por uma intervenção do governo federal. O jovem soldado foi incluído entre os réus do processo aberto pela Justiça Militar, que concluiu que o sexo teria sido consentido e que o crime seria de pederastia (sexo dentro de instituição militar) e não estupro, como alega o jovem. “A ministra (Maria do Rosário) disse em discurso aqui que não admite violações de direitos humanos, mas, quando o estado pode atuar para evitar que casos fiquem impunes, não o faz”, cobra.

Golin disse que irá relatar o não acompanhamento do caso por parte da Ouvidoria Nacional e cobrar providências sobre o estupro. “Sabemos das limitações do estado e dos interesses que influenciam, mas, o nosso papel é cobrar. E um dos casos que vim cobrar é este”, afirma.

 

Fonte: site do Sul 21